Entre os seios da montanha, a volúpia do matiz do sol vinha como aura ao trem que cantava nos trilhos “ma-ri-a-ma-ri-a-ma-ri-a”.
Muita alegria dá nisso: entorna-se em agonia. Mas à alegria me mesclei. Não me aceitei sem o minucioso mágico de ver chegar o trem que me trazia Maria. Na estação, era como se tivesse em mim um pote de cores e dele escapassem, volúveis, estelares, as que iriam tingir o nosso mundo, o meu e de Maria.
Aí o trem parou na estação. Aí fui eu, coração de menino a solta, impulsor, sem a nada fazer de conta, pois a vida era a paixão que me levitou até Maria. Maria no meio das gentes; gente que partia, gente que chegava. Milhar de gente, e uma pra mim: Maria de malas no chão.
Então tudo o que nos cercava se eterizou. Ou ficou na outra margem da deslembrança, que separa planos de vida. E estamos, eu e Maria, noutro plano... Tanto que a janela do meu quarto dá para a constelação de Pegasus, e a estrela Enif dá vida a sua cor laranja em cada fôlego nosso para o beijo.
Logo ali (e eu a abraço, à janela), depois de Pegasus, logo ali, um beijo depois de Pegasus, a grande constelação Amare, donde nos saltou o amor que vivemos e que nos estrela com faíscas da alegria. Encosto meu rosto no dela para ouvirmos as líricas canções que vagam pelo cosmos.
Mas aí é que muita alegria dá nisso: entorna-se em agonia. Que Pegasus se apagou, e nada de trem a cantar nos trilhos “ma-ri-a-ma-ri-a”. Há sim o meu gatinho a miar no meio do quarto com medo da chuva, que antes é o vento a bater a janela e os cabides vazios. Então fica assim: eu me sento na cama, pego o gatinho pra cama e deito os olhos nos cabides vazios, caído na certeza dorida de ter vivido mais um sonho de saudade de Maria.