“DEIXA DE COISAS e volta pra casa” é uma historinha da menininha Mim, a Yasmim. Uma historinha que ninguém leu, e que está escondida. Mas aí que está: por que Mim escondeu esta historinha?
“Simples”, disse Tinim, amiguinho dela. “Ela se imaginou uma menina invisível que grava o que se passa numa casa de pais, meninos, uma cadelinha e uma gata. E, com o negócio do invisível, muita gente grande iria rir dela. É isso”.
E a historinha da Mim é assim:
a mãe jogou as mãos no rosto e falou ao filho: “Deco, eu lhe disse pra dar comida à Lana sem soltar a corrente dela... E agora? Onde está nossa cadelinha Lana? Que um Anjo ajude seu pai a encontrá-la”.
Dorinha, no sofá com sua boneca que fala, falou: “Deco bateu nela, mãe. Por isso, ela fugiu”. Deco se defendeu: “Mentira dessa menina, mãe! Bati nela, não! Torci a orelha dela porque ela não quis comer, mas pular em mim”.
Dorinha voltou a entrega-lo: “Foi verdade sim, mãe. Ele bateu nela com o rodo. Eu vi”.
A mãe puxou os dois a si, e tentou controlar o astral: “Vamos fazer uma coisa, crianças. Vamos orar a São Chiquim de Assim pra que seu pai a encontre... Dorinha, por favor, puxe a oração”.
Depois de Dorinha, Deco fez a sua oração; e depois do Deco, a vez de a mãe fazer a sua oração. Daí, já de noitinha, chegou o pai, desanimado: “Lana sumiu. Procurei-a por quase toda a cidade”.
Não bastasse Lana, Dorinha deu falta da gata Nina. “Mãe, e a Nina?”. O pai correu à casinha dela, e nada de Nina. “Ninaáá! Miauuu! Ninaáá! Pronto, os dois sumiram”.
Foi que Nina não aguentou a ausência de Lana, como eles já não suportavam a ausência dos dois. A mãe, então, ajuntou-os a si e voltou à oração. Agora, a vez de o pai puxar a oração a São Chiquim de Assis.
Eles em prece, o “nheeec” do portão da rua se fez ouvir. Mim, à janela, virou a filmadora para o portão e captou algo inolvidável: a gata Nina, com a corrente de Lana na boca, trouxe-a para casa.
Mim era invisível e, por isso, não pode lhes dizer “Gente, Nina trouxe Lana pra casa... Olha só!”. Ela não disse, mas a mãe ouviu barulho na escada que dá à porta. “Psiu!”, pôs o dedo na boca, “Ai, meu Deus, será ladrão?”, ela cochichou, e perguntou ao marido, ainda ao cochicho: “Você não trancou o portão?”.
O marido disse “Não”, e foi pegar o rolo de abrir massas. Com ele à mão, e a outra mão na trinca da porta, ouviu-se Nina chamar, como em pedido de mimo, embaixo da porta: “Miaaau!”.
Dorinha deu um pulo de jogar a boneca na invisível Mim. A mãe abraçou Deco, que urrou de choro na barriga dela. Daí, eles se calaram e abriram ala pra Nina atravessar a sala, toda-toda, puxando Lana pra sua casinha.
Foi festa só, e Deco quis dormir, pelo menos, com a cabeça na casinha de Lana. “Hã, hã!”, negou a mãe. Nisso, Mim desligou a filmadora e ficou a imaginar que Nina, ao encontrar Lana, havia-lhe dito: “Lana, minha amiga, perdoa o Deco. Ele errou com você, o coração dele sabe disso, mas ele te ama. Todo mundo te ama. Vai, deixa de coisas, volta pra casa...”.
À escritora Nena Medeiros,
que trabalha, incansavelmente, em prol dos animais abandonados.