Esse texto vai para a criativa menina Laura Fernandes Lemes de Oliveira
Céuzinho em peso ouviu os gritos aflitos da mãe de Aninha. À rua, gritou e pulou e chorou ao céu que haviam roubado o coração da filhinha.
―Ué, zusmarijosé! ― benzeu-se uma vizinha.
A professora se enfiou no meio do povo plantado à frente da casa, e, que nem o povo, de sobrancelha lá em cima, ouviu da mãe de Aninha que ela chorava às paredes do quarto.
A menina, tadinha, soluçava, cabisbaixa, passarim sem par, dedinhos no peito caçando o coração, cabelinho de Santa Luzia no colo. Então a professora arregaçou as mangas: “Ah, eu quero ver a cara desse ladrão!”
Os meninos Cico, Helim, Dorinha, mais o Velhinho 84, investigadores. O Velhinho 84, também aluno, também da roda, também do rolo, suspeitou do garoto poeta, do garoto da viola, do garoto de olhos verdes.
Reunidos na casa de Aninha, a professora pega e quis saber com quem ela andara naqueles dias. Helim disse que ela correu e pulou e gemeu e sarou como todo mundo eles. Já o Velhinho 84, cismado com o garoto de olhos verdes, disse o que dizia sua mãe: “Ôio verde atrai coração, bamboleia o coitado e ó, zás, rouba ele”.
Outro velhinho, o delegado, manso no seu burrinho, sem suspeito, foi de opinião que o ladrão não tinha o que fazer, o que lucrar, o que viver com o coração de Aninha; que iria recolocá-lo no peito dela e pronto. “Cês irão ver.”
Sim, eles viram. Antes, ouviram os ais do Zequinha, o menino tido como “o bobo”, ele à porta, lado de fora, fora da paz. A professora saiu e se quedou e se pasmou com o coração da menina na palma da mão do Zequinha.
No rostinho do menino “o bobo”, o trilho das lágrimas. E elas pintavam e molduravam de jeito a sua dor de ter roubado o coração. Então a professora lhe fez sinal que fosse pendurar a joia ao peito da sua amiga Aninha, e ele entrou para o quarto.
O povo, olhos doidos pra ver alguém sem o coração, não o viu. Viu foi boiando seus olhos, assim que “o bobo”, à calçada, se ajoelhou e beijou e molhou os pés de Aninha, em perdão. Mais: que ia dobrar a esquina, “o bobo” voltou o rosto e abriu, vez primeira na vida, o arzinho de riso; o arzinho de riso que Aninha apanhou, arrumou, amoitou no seu coração de verdade.